30.7.03

Do deserto

Há momentos em que apetece parar. Ser chamado ao deserto, para ouvir-Te falar ao nosso coração. Andamos embrenhados nos dias e nas noites, passamos apressados pelos outros na cidade, esquecemo-nos de olhar para Aquele que habita em nós.

O Carlos - amigo de alguns que por aqui passam (tantas vezes apressados) - esteve este ano no seu deserto. Ontem recebemos uma carta dele em casa, a anunciar que está «de regresso». E com as suas palavras fala-nos ao coração, como o Senhor que seduziu a sua mulher (Oseias 2, 16).

Sem e-mail, quase sem telefone, recebeu 134 cartas em dez meses. E escreveu muitas mais. Nós não lhe escrevemos tanto assim - mas tivemo-lo presente e quisemo-lo celebrante naquilo que foi o momento da nossa história feito único. Como não devemos escrever mais para a morada deste ano, adverte-nos, procuro estoutra morada no deserto para lhe dizer do quanto a sua travessia foi também a nossa.

Despojado de sandálias, o Carlos voltou constantemente à brisa, «[acolhendo] cada dia com a certeza da Páscoa!»

Espartilhados entre a família, os amigos, a casa, o emprego, os transportes, os blogues, a espuma dos dias acaba por esconder a beleza da sarça ardente, da paixão que é a vida. Vou lá fora olhar o céu, sentir a brisa suave. E amar.

«Reconheço Deus na brisa suave, ao jeito de Elias, e na sarça ardente, como Moisés. Preciso da experiência da brisa suave para criar disponibilidade para a intensidade do fogo; preciso da paixão do fogo para que o desejo da brisa seja sempre maior e mais profundo.»
Apetece parar - e saborear. Bem-vindo, Carlos!