19.9.03

O justiceiro do jornalismo

Ah! Agora que até nesta página há uma ligação directa para o famoso "muito mentiroso", eis que surge a discussão sobre se devemos ou não dar atenção a uma coisa anónima.

Tal como o Miguel, julgo que não se deve dar atenção a atoardas. Lembro-me que as ciganas do Parque Eduardo VII, como não me convenciam a que as deixasse ler-me a sina, diziam que ia morrer logo ali na passadeira. Atoardas e anónimas, porque nunca soube o nome das senhoras.

O blogue em causa, no entanto, levanta outros problemas, julgo, que são os seguintes:

1) Enquanto os textos chegavam às redacções em cartas anónimas, eram apenas de consumo jornalístico e de uma pequena clique que anda a ver se descobre a «verdade». Era um entre milhares de textos, documentos, processos, recibos estranhos, fotocópias passadas à socapa nas noites de Lisboa ou bares esconsos de hotel. Quem anda nisto sabe como estas coisas se passam e o seu dever é, sempre, olhar para os papeis, desconfiar e, se assim se justificar, investigar.

2) Quando o texto se torna público através da internet, e por causa do seu conteúdo, há uma expectativa óbvia: será que os visados vão responder? Apresentar queixa crime? Será que o Procurador Geral da República vai tomar medidas. Espante-se: nada acontece. O dono da PJ vem dizer que nada faz e a PGR fica na mesma. Então, coloca-se a segunda questão: será o texto tão mentiroso que ninguém lhe liga (os números e a própria investigação jornalistica desmentem esta hipótese em pontos concretos desse texto) ou há fundo de verdade e qualquer queixa pode ser prejudicial para os próprios queixosos.

3) Ávidos de notícias da Casa Pia, os jornalistas seduzem-se como o peixe pelo isco e, infantil e perguiçosamente, mordem-no. Uma semana depois três jornais referem o blog. Duas semanas depois uma televisão publicita-o a milhões de pessoas. Sempre com o mesmo gesto que os putos fazem perante filmes de terror: tapam a cara com a mão, mas abrem os dedos.

4) O MuitoMentiroso é, de facto, mentiroso. Porque se há questões que levanta que são preocupantes, há outras - quer nos textos corridos quer nas perguntas - que são falsificações bem conhecidas de quem investiga o caso.

5) Para provar tudo isto, saibam que um novo texto, chamado «O Polvo, continuação», anda nas redacções há duas semanas e é oriundo do mesmo GOVD, o tal alegado grupo que rema contra a maré. Mas ainda não apareceu no blog. Mas muitos jornalistas, investigadores e cromos de Portugal já o trazem bem junto ao corpito.

Conclusão: uma denúncia anónima merece ser investigada, está na lei. Uma imbecilidade anónima, sem provas e só com lama para atirar deve ser ignorada. Não lembra que o «Avante!», ainda clandestino, tenha sido um jornal de atoardas. Por exemplo.