há um deus que assoma violento, implacável, irascível nas explosões de londres e de sharm-el-sheik. já tinha sido assim em nova iorque, depois em bali, madrid, jacarta, casablanca, mombaça, bagdad, num roteiro que parece marcar um novo mapa de terror sem olhar a rostos e credos, ideologias e cores. este deus não é um verdadeiro deus. arrepia, arrepia-se, arrepia-nos. este deus gritado por filhos menores não é misericordioso nem omnipotente. é obsceno, indigno.
o papa bento xvi veio depois pedir aos terroristas que "parassem, por Deus", numa formulação sábia. mas houve quem dissesse que não valia a pena – eles não o ouviriam porque o deus dos terroristas não aceita qualquer outro deus, sobretudo pela voz do representante de uma religião que é aquela que os terroristas também dizem combater ao falarem em cruzados, como se a idade das trevas fosse hoje. e é, argumentam iluminárias clarividentes, que nos dizem que "é a guerra, é a guerra e só assim podemos defender a nossa civilização". vã glória.
eu por mim também acho que deus não é para aqui chamado. em nenhum destes atentados está deus, um qualquer deus. nem Deus pode ser invocado por quem não entende qualquer linguagem de deus. desconhecer deus não é mau, o que é mau é refugiar-se num deus de morte, que não existe. o que existe é um ódio pretensamente "traduzido" para nos manter vigilantes e, pior, para nos meter medo. a esse ódio não se responde com mais ódio. também escusamos de dar a outra face, literalmente. podemos dá-la evangelicamente: construindo com o outro um outro mundo.
pragmáticos, muitos crentes e não crentes, crêem que sou lírico ou, como insultava um jornalista desta praça, um "falso pacifista que se quer render aos inimigos". nem uma coisa nem outra: apenas continuo a entender que o terror de dresden e hiroxima e londres (na segunda guerra) não deve ser repetido – aniquilar o já aniquilado, ou, no caso dos ataques actuais, cair numa espiral de violência que rapidamente nos levaria à orgia sanguinária daquela grande guerra.
erradicar deus, não é erradicar o divino – nem Deus, claro. é erradicar o discurso que insiste na justificação hedionda de um qualquer deus pequeno que torna menores todas aquelas vidas – de quem se alimenta e vive pelo terror.
este texto pode perder-se na espuma dos dias de férias ou na letra propositadamente pequena. não me importa, se a nossa atitude for outra, ao encontro do outro, para que nunca mais nenhum outro invoque o nome de deus em vão ou em socorro do horror. ámen: assim seja.
[originalmente publicado na Terra, que tem um best of imperdível, para estas férias.]
o papa bento xvi veio depois pedir aos terroristas que "parassem, por Deus", numa formulação sábia. mas houve quem dissesse que não valia a pena – eles não o ouviriam porque o deus dos terroristas não aceita qualquer outro deus, sobretudo pela voz do representante de uma religião que é aquela que os terroristas também dizem combater ao falarem em cruzados, como se a idade das trevas fosse hoje. e é, argumentam iluminárias clarividentes, que nos dizem que "é a guerra, é a guerra e só assim podemos defender a nossa civilização". vã glória.
eu por mim também acho que deus não é para aqui chamado. em nenhum destes atentados está deus, um qualquer deus. nem Deus pode ser invocado por quem não entende qualquer linguagem de deus. desconhecer deus não é mau, o que é mau é refugiar-se num deus de morte, que não existe. o que existe é um ódio pretensamente "traduzido" para nos manter vigilantes e, pior, para nos meter medo. a esse ódio não se responde com mais ódio. também escusamos de dar a outra face, literalmente. podemos dá-la evangelicamente: construindo com o outro um outro mundo.
pragmáticos, muitos crentes e não crentes, crêem que sou lírico ou, como insultava um jornalista desta praça, um "falso pacifista que se quer render aos inimigos". nem uma coisa nem outra: apenas continuo a entender que o terror de dresden e hiroxima e londres (na segunda guerra) não deve ser repetido – aniquilar o já aniquilado, ou, no caso dos ataques actuais, cair numa espiral de violência que rapidamente nos levaria à orgia sanguinária daquela grande guerra.
erradicar deus, não é erradicar o divino – nem Deus, claro. é erradicar o discurso que insiste na justificação hedionda de um qualquer deus pequeno que torna menores todas aquelas vidas – de quem se alimenta e vive pelo terror.
este texto pode perder-se na espuma dos dias de férias ou na letra propositadamente pequena. não me importa, se a nossa atitude for outra, ao encontro do outro, para que nunca mais nenhum outro invoque o nome de deus em vão ou em socorro do horror. ámen: assim seja.
[originalmente publicado na Terra, que tem um best of imperdível, para estas férias.]