4.3.04

A (quase) omissão de Mel Gibson

Não vi o filme de Mel Gibson, mas já tive alguns ecos do meu irmão e de Nuno Guerreiro. Não posso falar dele como obra de cinema que é - quando cá chegar, a 11 de Março, veremos. Quem viu sublinha a violência, a extrema violência - era assim que eram torturados os prisioneiros de Roma, todos eles.

Mas este repisar da violência é que me incomoda(rá). Mais do que alegadas mensagens anti-semitas, que parecem afinal ter sido retiradas ou não existirem. Afinal, esta é uma visão da Paixão de Jesus que recuso. Por esquecer a Vida - que vem depois, que completa o caminho do Gólgota. E que o transcende. Por isso, quando José escreve no seu Guia dos Perplexos, «é na Paixão que reside o carácter mais essencial, a beleza mais transcendente, o carácter mais distintivo da nossa Fé Cristã», eu vacilo.

Acho que é na Páscoa, na Ressurreição, que reside, na minha modesta opinião, o carácter mais essencial e distintivo da Fé. E é isso que é quase omitido no filme de Gibson. De raspão, no final, dá-se conta da Ressurreição de Jesus. Da vitória da Vida sobre a morte, a dor e o sofrimento.

Mas isso não parece o importante para o realizador australiano: sublinhar a dor e o sofrimento será uma perspectiva redutora, simplista e (quanto a mim) ultrapassada do cristianismo. «A nossa cruz», uma expressão tantas vezes usada pelos nossos pais e avós, ou sacrifícios estéreis como de muitos peregrinos de Fátima, deviam ser "erradicados" da linguagem da Fé. Para que esta seja verdadeiramente uma Festa.